NOTA SOBRE A LEI Nº 9.956/2023 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
A Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Rede-In), composta por 15 organizações da sociedade civil, vem a público manifestar-se contra a Lei nº 9.956/2023, sancionada no Estado do Rio de Janeiro, que autoriza a implementação de ABA – Análise do Comportamento Aplicada, para crianças e adolescentes autistas nas escolas da rede pública estadual.
É inadmissível que a escola se transforme em espaço terapêutico. Ocupar um espaço educacional com terapias individuais subverte o entendimento de que na escola devem ser priorizados o currículo, as práticas pedagógicas, as aprendizagens e o desenvolvimento, que se dão por meio das interações em um ambiente coletivo e heterogêneo. A convivência com as diferenças e com a singularidade humana é a premissa para a formação cidadã e o fortalecimento da democracia no contexto da Educação.
O direito de acesso de crianças e jovens com deficiência, Transtorno do Espectro do Autismo/Transtorno Globais do Desenvolvimento e altas habilidades/superdotação à educação e à escola comum foi conquistado através de muita luta e mobilização política das pessoas com deficiência. Ao longo dos anos os marcos legais de fortalecimento da educação inclusiva têm avançado, como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que tem status de Emenda Constitucional e prevê a obrigatoriedade de um sistema educacional inclusivo, a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei Nº 13.146/15).
Ao possibilitar que o método ABA entre na escola, voltamos ao antigo e já abandonado modelo médico da deficiência e a correr o risco de que ela se transforme em um espaço de clínica-escola. Há décadas seguimos um outro modelo, o modelo social da deficiência ou o paradigma da inclusão – que defende justamente o contrário, que os ambientes e a sociedade se transformem para reduzir e mitigar barreiras à participação de pessoas com autismo e outros grupos excluídos por suas características individuais e de diversidade humana.
O ABA é considerado um tratamento de saúde. É uma opção terapêutica entre outras e não deve ser imposta por qualquer instituição já que as famílias e suas crianças, ou adolescentes, têm, e não devem perder, o pleno direito de escolher quais abordagens ou técnicas terapêuticas adotar e seguir e, inclusive, experimentar e poder mudar.
Assim, tendo em consideração o que se entende por educação, reabilitação e direitos humanos, sob o paradigma da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, entendemos que a inclusão de ABA para pessoas autistas no ambiente escolar compromete a ética, a pedagogia a e as normas legais, tirando a autonomia de professoras e professores de assumirem suas funções e responsabilidades pedagógicas.
A Rede-In defende que toda pessoa com deficiência, Transtorno do Espectro do Autismo/Transtorno Globais do Desenvolvimento e altas habilidades/superdotação tenha seu direito à saúde integralmente garantido por meio do fortalecimento e aprimoramento de políticas públicas intersetoriais, nos equipamentos de referência, sempre pautado pelo modelo social da deficiência, mas sem infringir os princípios da educação inclusiva. A escola é um espaço de convívio indiferenciado onde devem ser promovidas ações de plena inclusão, por meio de variadas estratégias pedagógicas, para toda e qualquer criança. Não queremos que a lógica médica e terapêutica invada espaços educacionais.
REDE BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA*
* Compõem a Rede-In: Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas; Associação Amigos Metroviários dos Excepcionais – AME-SP; Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência, de Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade – APABB; Associação Nacional de Emprego Apoiado – ANEA; Associação Nacional de Membros(as) do Ministério Público em Defesa das Pessoas com Deficiência e Idosos – AMPID; Coletivo Brasileiro de Pesquisadores e Pesquisadoras dos Estudos da Deficiência – MANGATA; Escola de Gente – Comunicação em Inclusão; Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down – FBASD; Instituto JNG – Moradia para Vida Independente; Instituto Jô Clemente – IJC; Instituto Rodrigo Mendes; Mais Diferenças – Educação e Cultura Inclusivas; Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e Com Baixa Visão – MBMC; Rede Brasileira do Movimento de Vida Independente – Rede MVI e Visibilidade Cegos Brasil.
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