A AMPID defende o Índice de Funcionalidade Brasileiro (IF-Br) em estágio final de validação, tendo à frente a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em convenio firmado com a Universidade de Brasília (UNB) pois estão presentes os critérios de legitimidade e competência legal para a sua construção.
NOTA PÚBLICA DE INFORMAÇÃO SOBRE O INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO BIOPSICOSSOCIAL
A AMPID vem a público informar que participou da última reunião do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CONADE), ocorrida em 23/outubro/2019, por meio de sua Presidenta Maria Aparecida Gugel e de seu representante o Conselheiro Hugo Frota.
Nessa ocasião, o tema em debate tratou do instrumento de avaliação biopsicossocial, em especial o documento apresentado pelos médicos peritos do INSS nominado de “Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência – PROBAD”, e suas implicações legais se aprovado for. A representação da equipe que elaborou o documento não esteve presente.
A AMPID defende o Índice de Funcionalidade Brasileiro (IF-Br) em estágio final de validação, tendo à frente a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, em convenio firmado com a Universidade de Brasília (UNB) pois estão presentes os critérios de legitimidade e competência legal para a sua construção.
Primeiro: A partir da Convenção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (2009)(CDPD), norma de natureza constitucional, o conceito de deficiência passou do modelo biomédico, centralizado na doença e nas limitações do corpo, para o modelo biopsicossocial, que compreende além do impedimento, barreiras socioeconômicas, ambientais e atitudinais.
Enquanto o modelo biomédico se atém a uma visão reducionista e fragmentada da deficiência, centrada apenas no organismo, a avaliação biopsicossocial privilegia uma visão sistêmica de saúde.
No modelo biopsicossocial o reconhecimento da deficiência é feito a partir de um olhar multifatorial, por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar, integrando de forma dinâmica não somente várias perspectivas da vida da pessoa com deficiência, como também os saberes de diversas disciplinas, de modo a avaliar a pessoa com deficiência em sua integralidade.
Segundo: A Lei Brasileira de Inclusão das Pessoas com Deficiência (LBI) determina que a avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará os impedimentos nas funções e estruturas do corpo (atribuição médica), os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais (atribuição de psicólogos, assistentes sociais, por exemplo), a limitação no desempenho de atividades (atribuição de terapeuta ocupacional, por exemplo) e restrição de participação (atribuições de variados profissionais juntos).
É bom lembrar que não tem qualquer fundamento a interpretação defendida por alguns de que o Parágrafo Único do artigo 2º da LBI determina a avaliação biopsicossocial como uma segunda opção e somente se necessária, vez que a aplicação das interpretações gramatical e racional (mens legis e mens legislatoris) no referido dispositivo leva a uma só conclusão: para a CDPD e a LBI há somente uma única forma de avaliação da pessoa com deficiência, que é a avaliação biopsicossocial.
Terceiro: O Decreto nº 8.954, de 10 de janeiro de 2017 instituiu o Comitê do Cadastro Nacional de Inclusão da Pessoa com Deficiência e da Avaliação Unificada da Deficiência, formado por representantes de vários Ministérios com a finalidade de criar instrumentos para a avaliação biopsicossocial da Deficiência. O CONADE, no referido Comitê, representa o controle social e o movimento social organizado das pessoas com deficiência.
Quarto: A Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (SNDPD) empenhou-se, mediante carta-acordo entre a Universidade de Brasília (UNB) e a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEA), custeados por impostos de todos nós brasileiros, para edificar o instrumento de avaliação biopsicossocial. A escolha da UNB se deu por sua notória experiência técnica a partir da elaboração do relatório final de validação do IF-BrA que mede a redução do tempo de contribuição para trabalhadores com deficiência do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) (Lei Complementar n° 142/2013). Esse instrumento passou a ser utilizado pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) para conceder o benefício de aposentadoria de acordo com o grau da deficiência – leve, moderada ou grave.
Quinto: Há recomendação expressa da Organização Mundial de Saúde (OMS) no Relatório Internacional sobre Deficiência, publicado em 2011 (https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44575/9788564047020_por.pdf;jsessionid=C8449B91B13597DE65324F64480B530F?sequence=4 ), para que os países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) adotem a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) como instrumento único, de maneira a unificar todas as linguagens dos instrumentos em nível internacional.
Sexto: A proposta de avaliação unificada da pessoa com deficiência, por meio do Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência – PROBAD, foi elaborada por peritos médicos, que representam um percentual ínfimo dos mais de 500 mil médicos brasileiros, têm atribuições específicas para as atividades de gestão governamental, de gerenciamento, de supervisão, de controle, de fiscalização e de auditoria das atividades de perícia médica, segundo a Lei nº 13.846/2019 que alterou a Lei nº 9.620/1998. Portanto, não é de sua atribuição erigir um documento da natureza da avaliação biopsicossocial que envolvem outras áreas técnicas especializadas e da sociedade civil organizada. O Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência – BROBAD é, portanto, ilegítimo e nasce de mãos sem atribuição para tal.
Sétimo: O documento chamado de Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência – PROBAD contém o selo da Perícia Médico Federal – Ministério da Economia – secretaria Especial de Previdência e Trabalho – Secretaria de Previdência – Subsecretaria de Perícia Médica Federal, já foi apresentado no Senado Federal (https://www12.senado.leg.br/noticias/audios/2019/10/cas-debate-avaliacao-biopsicossocial-da-pessoa-com-deficiencia ), na Câmara dos Deputados (https://eduardobarbosa.com/audiencia-pubica-debate-implantacao-da-avaliacao-biopsicossocial-da-deficiencia ), sem ouvir as pessoas com deficiência legitimamente representadas e/ou outras áreas e profissionais da deficiência. Referido documento, segundo as exposições do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e da Federação Nacional de Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (FENASPS), em reunião do dia 23/10/2019 no CONADE, foi apresentado em agências de São Paulo para aplicação. Portanto, a Subsecretaria de Perícia Médica Federal se utiliza de um instrumento não validado e sem ordem legal, cuja prática se denuncia.
O Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência PROBAD, está em total dissonância e viola os princípios e disposições da CDPD e o Comentário Geral n° 7 do Comitê de Peritos da citada Convenção.
O Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência PROBAD viola em especial o Artigo 3, alínea “c”; o Artigo 4 item 1, alíneas “a” e “d”, e em especial, o item 3 que afirma que
A elaboração e implementação de legislação e políticas para aplicar a presente Convenção e em outros processos de tomada de decisão relativos às pessoas com deficiência, os Estados Partes realizarão consultas estreitas e envolverão ativamente pessoas com deficiência, inclusive crianças com deficiência, por intermédio de suas organizações representativas.
Portanto, o lema que dá vida à CDPD não foi atendido quanto ao modo e forma de realização do Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência PROBAD, ou seja Nada sobre nós sem nós!
A violação torna-se ainda mais evidente quando se consulta a orientação formulada no Comentário n° 7 do Comitê de Peritos da CDPD, publicada em 03/10/2018, a qual esclarece no item II sobre o conteúdo normativo dos Artigos 4 item 3, e 33 item 3, que:
Para cumprir as obrigações decorrentes do artigo 4, parágrafo 3, os Estados Partes devem incluir a obrigação de manter consultas estreitas e integrar ativamente as pessoas com deficiência, por meio de suas próprias organizações, em estruturas e procedimentos legais e regulamentares em todos os níveis e setores do governo.
Os Estados partes devem considerar as consultas e a integração de pessoas com deficiência como uma medida obrigatória antes de aprovar leis, regulamentos e políticas, gerais ou relacionadas à deficiência. Portanto, as consultas devem começar nos estágios iniciais e contribuir para o resultado final em todos os processos de tomada de decisão. As consultas devem incluir organizações que representam a grande diversidade de pessoas com deficiência nos níveis local, nacional, regional e internacional.
Portanto, o Ministério da Economia, ao apresentar e aplicar o Protocolo Brasileiro de Avaliação da Deficiência PROBAD em suas agências de São Paulo, não só violou as disposições dos artigos acima citados da CDPD, como está em total dissintonia com a orientação inscrita no Comentário n° 07 da Comitê de Peritos da CDPD, que preveem a responsabilidade do Estado Parte (o Brasil) de assegurar a participação das organizações representativas da deficiência em todos os processos de tomadas de decisões, sejam eles referentes a propostas legislativas, administrativas e de políticas públicas, desde os estágios iniciais, para que possam contribuir para o resultado. Tal descumprimento da CDPD enseja não só a sua total rejeição, mas também a denúncia junto ao Comitê de Peritos, que fiscaliza o Protocolo Facultativo da Convenção, caso venha a ser adotado pelo Governo Federal.
Oitavo: Tendo ouvido atentamente os posicionamentos, a AMPID rechaça os pronunciamentos dos representantes da Casa Civil, Ministério da Economia e do Ministério da Cidadania junto ao CONADE, posto que o documento elaborado pelos médicos peritos i) “não vazou” – ele já esteve em discussão no Congresso Nacional, gerando insegurança para a sociedade em geral -, e ii) não se trata de a Casa Civil “escolher o melhor documento técnico científico” mas, sim, opinar, referendar sobre o único instrumento possível e legítimo que é o Índice de Funcionalidade Brasileiro (IF-Br M).
Brasília, 23 de outubro de 2019.
Maria Aparecida Gugel, Presidenta AMPID
Gabriela Gadelha Barboza de Almeida, Vice-Presidenta AMPID
Hugo Frota Magalhães Porto Neto, Conselheiro CONADE/AMPID