Nota de Repúdio ao Projeto de Lei Nº 1231/2015 que altera o artigo 93 da Lei Nº 8.213, de 24 de Julho de 1991

NOTA DE REPÚDIO AO PROJETO DE LEI Nº 1231/2015 QUE ALTERA O ARTIGO 93 DA LEI Nº 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991

A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Idosos (AMPID), tomando conhecimento da retomada de tramitação do Projeto de Lei nº 1231/2015, proposto pelo então Deputado Vicentinho Júnior, ao mesmo tempo em que o repudia esclarece que:

Em 22/04/2015 o Deputado Vicentinho Junior apresenta o Projeto de Lei nº 1231/2015, pelo Deputado Vicentinho Júnior (PSB-TO), que altera a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, “para incluir mecanismos de facilitação da contratação de pessoas com deficiência na iniciativa privada e medidas de compensação a serem adotadas quando a cota mínima não puder ser alcançada por razões alheias à vontade do empregador”.

Em setembro de 2015, após contato e esclarecimentos com a associada signatária, então membra auxiliar do Núcleo de Atuação em Acessibilidade (Neace) do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), encaminhou a Sua Excelência e assessoras (Tania e Mara Regina) a seguinte mensagem:

“Conforme falamos, seguem posicionamento e sugestões para eventuais ajustes no PL 1.231/2015, todos baseados na CDPD e LBI (lei 13.146/2-15 que entra em vigor em janeiro 2016):

Artigo 1º que altera o artigo 93, parágrafo 3º. A geração de dados estatísticos é benéfica para a construção de políticas públicas, tanto que a LBI assim os prevê no artigo 101. Mas, referir-se a “controle” estatístico impõe a necessidade de fiscalização. A proposta do seu parágrafo 3º é da atribuição dos SINEs. Daí porque sugiro uma reunião com o representante para conferir se esta providência já não está sendo tomada (até onde conheço acho que está).

Artigo 2º que acrescenta o artigo 93-A B à lei 8.213/91, para excluir da reserva os postos de trabalho em condições de periculosidade de insalubridade é inconstitucional, diante do artigo 27, da CDPD que tem natureza constitucional. A convenção trata de todo o tipo de trabalho de livre escolha da pessoa com deficiência. E não poderia ser de outra forma pois todos tem o mesmo direito de oportunidades e não discriminação (artigo 5, da CDPD). Também contrária a LBI (artigo 34, parágrafo 3º) que veda qualquer restrição ao trabalho. É o ambiente de trabalho que deve ser acessível para trabalhadores com deficiência. É o ambiente de trabalho que deve ser saneado para minorar as condições perigosas e insalubres para todos os trabalhadores, incluídos os trabalhadores com deficiência.

Artigo 3º que acrescenta o artigo 93-B à lei 8.213/91, para criar bolsas de capacitação/qualificação, mitigação da reserva e criação de reversão de doações: de maneira geral o artigo é inconstitucional pois nosso sistema de ação afirmativa por meio da reserva de cargos, decorrente do artigo 37, inciso VIII da Constituição da República + a lei 8.213/91 não admitem mecanismos compensatórios e como norma de ordem pública que é deve ser cumprida. A única possibilidade para não cumprir a reserva é a demonstração inequívoca de impossibilidade. Ainda assim, os órgãos de fiscalização (MPT e MTE) concedem prazo para o cumprimento.

Pois bem, o inciso I, alíneas a-c, isentaria as empresas do cumprimento da reserva por meio de bolsa qualificação, mitigando a reserva, que como visto acima, não se coaduna com o nosso sistema. Serviria isso sim para fraudar o sistema de reserva, ferindo inclusive o próprio sistema de contagem dos trabalhadores em uma empresa, com anotações oficiais específicas em CAGED e CNIS. A única possibilidade, conforme lhes relatei, é a contratação desse trabalhador a ser habilitado/qualificado, conforme já realizado pelo setor financeiro. A experiência serviu de modelo para a LBI que já prevê a possibilidade de a habilitação/qualificação profissional ocorrer na própria empresa (artigo 36, 6º).

O inciso II propõe o sistema compensatório de doações que fere o sistema legal para doações. É também uma medida inserta pois pode gerar muita fraude”.

Ainda no ano de 2015, emendas foram apresentadas ao PL 1231/2015 (30/06/2015 – EMC 1/2015 CTASP, Deputado Silvio Costa; 13/08/2015 – EMR 1 CTASP, Deputado Benjamin Maranhão), sem a observância de conquistas aos direitos já alcançados com a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, recém iniciada a vigência, e persistindo em afrontar a ação afirmativa de reserva de cargos. Pareceres que se seguiram (Deputado Benjamin Maranhão), aprovaram projeto e emendas mas, também, deixaram de analisar conquistas e comandos constitucionais sobre o direito a reserva de cargos, sem restrições. Arquivado com base no artigo 105 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Ressurge em 2019.

Seguiram-se os anos com o apensamento a este protótipo de afronta a ação afirmativa de reserva de cargos para trabalhadores e trabalhadoras com deficiência em empresas com cem ou mais empregados outros variados projetos de lei PL 6366/2016, PL 2680/2023, PL 6709/2016, PL 5433/2019, PL 9959/2018, PL 3504/2019, PL 749/2021, PL 4702/2023.

Nesse ano de 2023, o PL foi novamente desarquivado e indicada relatora Deputada Fernanda Pessoa. O projeto mantém-se em conteúdo, assim como os dois substitutivos apresentados. Nesse tempo de tramitação a sociedade civil organizada e as pessoas com deficiência continuam sem ser ouvidas.

A AMPID, junto às demais organizações da sociedade civil, continuam a acompanhar essa proposta de afronta à ação afirmativa de reserva de cargos, a qual está seguramente prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/91 que persiste no tempo, não obstante os ataques ao seu conteúdo. Referido artigo 93 da lei está sedimentado em comandos constitucionais (artigo 37 inciso VIII, da Constituição da República e Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – Artigo 27 do Decreto nº 6.949/2009), e respaldado em atualizações de conteúdo eficaz do artigo 101 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Lei nº 13.146/2015.

Por oportuno, relembra-se da mensagem acima referida e encaminhada em 2015 ao Deputado proponente pois, continua hígida em conteúdo, em especial quanto à necessidade de ambiente de trabalho acessível e inclusivo para garantir o trabalho de livre escolha de trabalhadores e trabalhadoras com deficiência; a não mitigação da reserva de cargos (cota) com bolsas ou qualquer outra forma de fugir ao cumprimento dela.

Brasília, 11 de outubro de 2023.

Sandra Lucia Garcia Massoud – Presidenta

Maria Aparecida Gugel – Conselho Científico

 

Para acessar a nota em PDF, clique aqui

Compartilhe:

Instagram
LinkedIn
WhatsApp

Pessoa Idosa

Pessoa com Deficiência

Artigos

Veja mais matérias

Pular para o conteúdo