13 de janeiro de 2023
Carta Aberta ao Presidente Lula sobre a inaceitável redução da estrutura de cargos da Secretaria Nac. dos Direitos da Pessoa com Deficiência
A Rede-In (Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência) manifesta sua preocupação com a incompreensível redução da estrutura da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNDPD), por meio do Decreto 11.341, de 1º de janeiro de 2023. Tal Decreto prevê um quadro técnico cerca de 50% (cinquenta por cento) menor que o previsto em 2009 para essa Secretaria Nacional, de 27 para 14 cargos.
Alertamos para o risco de que tal decisão minimize, retarde ou impeça o adequado planejamento e a amplitude das ações que a SNDPD deve executar com urgência, devido à crescente violência e segregação que hoje experimentam pessoas com deficiência que moram no Brasil, principalmente aquelas vivendo em regiões de periferia e em processo de grave empobrecimento, em sua maioria pessoas negras.
Essa situação piorou após uma quadra histórica marcada pelo assistencialismo e exclusão, decorrente principalmente da falta de acesso a bens, serviços e políticas públicas, em especial nas regiões mais impactadas pela desigualdade econômica, o que resulta no agravamento da deficiência.
O preconceito e discriminação que atingem pessoas com deficiência de maneira estrutural, na forma do capacitismo, precisam ser combatidos com uma estrutura de governo compatível com a magnitude do desafio.
Destacamos quatro razões principais que sustentam o nosso pedido:
⦁ A SNDPD foi criada em 2009 justamente para implementar leis e políticas que dessem resposta aos compromissos assumidos pelo Brasil após a assinatura e aprovação, com valor de Emenda Constitucional, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e do seu Protocolo Facultativo
⦁ A redução, então, da capacidade operativa da SNDPD, vai na contramão do compromisso do Estado brasileiro com esse tratado internacional de direitos humanos
⦁ Ao esvaziar substancialmente o número de servidores e servidoras que atuariam na SNDPD e, ao mesmo tempo, expandir outras secretarias que tratam dos demais assuntos de diversidade, a presidência contraria, e até afronta, a forte, convincente e histórica expressão da diversidade defendida pelo presidente Lula, particularmente neste terceiro mandato, no que se refere à deficiência. Ao restringir o alcance técnico, financeiro e político da SNDPD, a presidência esvazia o simbolismo do ato de ter subido a rampa, no momento da posse, em 1º de janeiro de 2023, acompanhado de uma pessoa com deficiência
⦁ Dado o inacreditável descaso a que foram submetidas pessoas com deficiência nos últimos anos, é urgente reconstruir programas, políticas e leis inclusivas do país, concretizando os princípios da Constituição Federal, incluídos os da CDPD, que deram origem à SNDPD. Essa necessidade torna-se ainda maior se considerada a realidade pós-pandemia da Covid-19, que deixa o mundo com mais pessoas com deficiência, principalmente crianças. Segundo a ONU, mais de 80% da população com deficiência do mundo vive nas periferias de países como o Brasil, sem esgoto, saneamento, acesso à vacinação, à mobilidade, à cultura, à educação e à participação na vida política e econômica, compondo um contingente que hoje vive a maior exclusão de suas histórias.
Nesse contexto, a SNPD necessita ter capacidade técnica para transversalizar a pauta de deficiência através das diversas políticas públicas governamentais. É imprescindível, portanto, seguir fortalecendo a SNDPD e todas as instâncias de governo capazes de corrigir os recentes retrocessos nesse campo e avançar na direção da concretização dos direitos humanos das pessoas com deficiência, em condição de igualdade com os demais e com equidade de raça, gênero e demais marcadores sociais da diferença.
Entendemos que a estrutura governamental ainda esteja em fase de recomposição, mas é urgente rever a decisão de diminuir a estrutura de cargos da SNDPD, que tem funções prioritárias e interseccionais junto a várias outras pastas, com vistas a implementar os direitos das pessoas com deficiência em todas as vertentes expressas na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e na Lei Brasileira de Inclusão e a combater a violação de tais direitos nas mais diversas esferas, necessitando, para tanto, ser robusta.
Incumbe-lhe efetivamente um conjunto complexo de competências que pressupõem, além de um número adequado de servidores e servidoras, também conhecimentos técnicos e políticos específicos. Nesse contexto, a redução efetuada nos quadros da Secretaria Nacional desconsidera a dimensão do trabalho que essa precisa realizar, especialmente neste momento histórico de reconstrução de direitos.
A Rede-In não se omitirá e alerta quanto ao grave risco de enfraquecimento do protagonismo da SNDPD na defesa e promoção de políticas em prol da inclusão e participação das pessoas com deficiência e na oferta de desenho universal e acessibilidade física, atitudinal, comunicacional e tecnológica, que, tanto presencial quanto virtualmente, foi profundamente ignorada no governo passado.
Nesse sentido, a Rede-In reivindica o cumprimento do compromisso do governo eleito de materializar seus propósitos inclusivos por meio de uma Secretaria com estrutura adequada para promover os direitos humanos de modo interseccional, que resultará em uma efetiva e não apenas aparente sociedade inclusiva brasileira.
Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Rede In
* Compõem a Rede-In: Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas; Associação Amigos Metroviários dos Excepcionais – AME-SP; Associação Brasileira por Ação pelos Direitos das Pessoas com Autismo – ABRAÇA; Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência, de Funcionários do Banco do Brasil e da Comunidade – APABB; Associação Nacional de Emprego Apoiado – ANEA; Associação Nacional de Membros(as) do Ministério Público em Defesa das Pessoas com Deficiência e Idosos – AMPID; Coletivo Brasileiro de Pesquisadores e Pesquisadoras dos Estudos da Deficiência – MANGATA; Escola de Gente – Comunicação em Inclusão; Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down – FBASD; Instituto JNG – Moradia para Vida Independente; Instituto Jô Clemente – IJC; Instituto Rodrigo Mendes; Mais Diferenças – Educação e Cultura Inclusivas; Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e Com Baixa Visão – MBMC; Rede Brasileira do Movimento de Vida Independente – Rede MVI; Vidas Negras com Deficiência Importam – VNDI e Visibilidade Cegos Brasil.
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