06 de julho de 2021
A Ampid preocupada com o teor do Edital de concurso público do Banco do Brasil para a carreira administrativa de escriturário lança nota com esclarecimentos sobre o que deve ser ajustado para garantir o o acesso de pessoas com deficiência
NOTA PÚBLICA DE REPÚDIO AO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO DO BANCO DO BRASIL
A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Idosos – AMPID, com o objetivo de contribuir com informações a todos(as) os candidatos(as) com deficiência interessados(as) sobre o conteúdo dos regramentos, repudia as cláusulas do Edital abaixo elencadas porque contrariam a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto nº 6.949/2009), a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), a Lei nº 8.213/99 e o Decreto nº 9.508/2018, e propõe a revisão do ato (do Edital).
O BANCO DO BRASIL lançou EDITAL DE ABERTURA SELEÇÃO EXTERNA 2021/001 EDITAL Nº 01 – 2021/001 BB, em 23 de junho de 2021, para a CARREIRA ADMINISTRATIVA – CARGO ESCRITURÁRIO:
1. Ao tratar da quarta etapa do processo de seleção, afirma que os procedimentos de admissão e de perícia médica terão caráter eliminatório:
d) 4ª Etapa – Procedimentos Admissionais e Perícia Médica, de caráter eliminatório, sob a responsabilidade do BANCO DO BRASIL S.A
1.2 – Os(As) candidatos(as) classificados(as) nesta Seleção Externa, após as 1ª, 2ª e 3ª Etapas, observada a necessidade de provimento e a ordem de classificação, serão convocados (as) para a 4ª Etapa.
[…]
3.7 – Possuir aptidão física e mental para o exercício das atribuições do cargo.
[…]
4.1.11.1 – O(A) candidato(a) que for considerado(a) inapto(a) para o exercício do cargo na Perícia Médica e, em razão da deficiência, se incompatibilizar com o exercício das atividades próprias do cargo, será eliminado(a) da Seleção Externa.
No entanto, a lei (artigo 168 da Consolidação das Leis do Trabalho e NR7) prevê que a perícia médica ocorra como anamnese, exame médico que ocorre no momento da admissão da pessoa e, no concurso público, não tem caráter eliminatório. Este procedimento, que é obrigatório, “tem caráter preventivo de rastreamento e de diagnóstico precoce de agravos à saúde relacionados ao trabalho do empregado público” (Gugel, 2019, p.205).
Assim, a 4ª etapa do processo de seleção e a perícia médica somente poderão ser aceitas como procedimento obrigatório de anamnese que antecede à nomeação. Não pode ser etapa eliminatória de concurso público.
Termos e concepções utilizadas no Edital (4.1.11.1) como “inapto(a) para o exercício do cargo na Perícia Médica”, “incompatibilizar com o exercício das atividades próprias do cargo”, já foram julgados impróprios pelo Supremo Tribunal Federal. Insistir com essa prática implica em discriminação em razão da deficiência, considerada crime e passível de reclusão, segundo o artigo 88 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.
Ao(À) candidato(a) com deficiência é reservado o direito de ter a sua avaliação no curso do estágio probatório por uma equipe multidisciplinar (artigo 5º do Decreto nº 9.508/2018) que irá avaliar, dentre outras condições, a natureza das atribuições e das tarefas essenciais do cargo, do emprego ou da função a desempenhar (inciso II), e a viabilidade das condições de acessibilidade e as adequações do ambiente de trabalho na execução das tarefas (inciso III).
No caso de empregados(as) públicos, esse acompanhamento ocorre nos três meses que seguem o período de experiência, tempo em que a equipe multidisciplinar avaliará a pessoa com deficiência e encaminhará ao(à) gestor(a) parecer contendo a indicação de necessidades de ferramentas de tecnologia assistiva, a promoção da acessibilidade do ambiente do trabalho e, se necessário, a adaptação razoável e das atividades frente as atribuições do cargo. Só então, estará garantido o acesso ao emprego público.
2. Sobre o direito de inscrição em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, o Edital prevê a reserva de vagas em 5% para candidatos(as) com deficiência.
4.1.1 – É assegurado o direito de inscrição na presente Seleção Externa às pessoas com deficiência que pretendam fazer uso da prerrogativa que lhes é facultada no Decreto nº 9.508, de 24 de setembro de 2018, em conformidade com a Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.
4.1.2 – Do total de vagas que vierem a ser oferecidas durante o prazo de validade desta Seleção Externa, 5% (cinco por cento) serão reservadas às pessoas com deficiência, conforme previsto no Decreto nº 9.508, de 24 de setembro de 2018, e alterações posteriores.
O Banco do Brasil é uma sociedade de economia mista e compõe a Administração Pública Indireta. Portanto, a admissão de empregados(as) públicos ocorre por meio de concurso público, na forma da Lei nº 8.112/1991. Deve também adotar os regramentos das empresas privadas (artigo 173, inciso II da Constituição da República) e observar a reserva de cargos prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/1991 ou seja, 5% do total de cargos do Banco do Brasil devem ser ocupados por pessoas com deficiência, pois detém mais de 1.000 (mil) empregados.
O artigo 1º, parágrafo 2º do Decreto nº 9.508/2018 afirma que ficam reservadas às pessoas com deficiência os percentuais de cargos de que trata o art. 93 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, às empresas públicas e às sociedades de economia mista.
Esse comando decorre de decisão do Tribunal de Contas da União no processo 003.839/2015-0 que determinou à Caixa Econômica a não mais adotar reserva de vagas em concursos públicos e convocação prioritária de candidatos(as) com deficiência.
Portanto, não é necessária a reserva percentual de até 20%, ou 5% como está no Edital. O Banco do Brasil deve, sim, inserir o número de cargos reservados para pessoas com deficiência, considerando a reserva de 5% sobre os mais de 97 mil empregados(as) públicos do Banco, o que resulta em torno de 4.800 cargos reservados para pessoas com deficiência nesse concurso público.
O Banco do Brasil deve aferir o número de cargos já preenchidos por empregados e empregadas públicos com deficiência e destinar os cargos restantes (ou o que falta para complementar a cota) para candidatos(as) com deficiência, inserindo esse número de cargos no Edital.
3. Quanto à lista de classificação e nomeação, consta do Edital que,
4.1.9 – Os(as) candidatos(as) que, no ato da inscrição, se declararem como pessoas com deficiência, se classificados(as) nesta Seleção Externa, terão seus nomes publicados em lista à parte por UF/Macrorregião/Microrregião e figurarão, também, na lista de classificação geral por UF/Macrorregião/Microrregião.
[…]
4.3.2 – O(A) primeiro(a) candidato(a) da lista de Pessoas com Deficiência deverá ser convocado para a segunda vaga aberta na Microrregião para a qual foi classificado; os(as) demais candidatos(as) da lista de Pessoas com Deficiência serão convocados(as) na Microrregião para a qual foram classificados após o intervalo de dezenove vagas providas pela Ampla Concorrência.
A previsão de publicação de lista à parte de candidatos(as) com deficiência está correto. Porém, quando trata da contratação desses candidatos e candidatas, o Edital não cumpre a sistemática de convocação dos candidatos classificados, respeitado o disposto nos § 1º e § 2º do art. 1º (artigo 3º inciso V do Decreto nº 9.508/2018), em atenção ao comando da decisão do Tribunal de Contas da União no processo 003.839/2015-0 para que, além da dispensa de reserva de vagas em cada concurso público, adote convocação prioritária de candidatos(as) com deficiência para cumprir artigo 93 da Lei nº 8.213/1991, norma de ordem pública.
Essa previsão de nomeação prioritária deve constar expressamente do Edital, que é a lei do concurso público e para que seja de conhecimento geral, de que os(as) candidatos(as) com deficiência classificados(as) (nas Microrregião, Macrorregião e UF) terão prioridade na contratação.
4. No que diz respeito à definição de pessoas com deficiência, o Edital elege os Decreto nº 3.298/1999, Decreto nº 5.296/2004, a Súmula 377 do Superior Tribunal de Justiça e a Lei nº 12.764/2012 e seu regulamento:
4.1.4 – Serão consideradas pessoas com deficiência aquelas que se enquadrem nas categorias discriminadas no artigo 4º do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, alterado pelo Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004, e as contempladas pelo enunciado da Súmula 377 do Superior Tribunal de Justiça e pela Lei n. 12.764, de 27 de dezembro de 2012, regulamentada pelo Decreto 8.368, de 2 de dezembro de 2014.
4.1.5 – Para se inscrever nesta Seleção Externa, na condição de pessoa com deficiência, o(a) candidato(a) deverá:
a) no ato da inscrição, declarar-se pessoa com deficiência;
b) enviar, via upload, a imagem do laudo médico, emitido nos últimos 12 meses, contados da data de publicação deste Edital, atestando a espécie e o grau ou nível da deficiência, com expressa referência ao código correspondente da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), bem como à provável causa da deficiência, contendo a assinatura e o carimbo do(a) médico(a) com o número de sua inscrição no Conselho Regional de Medicina (CRM), conforme definido no subitem 4.1.5.1. Caso o(a) candidato(a) não envie o laudo médico com referência expressa ao código correspondente da CID-10, não poderá concorrer às vagas reservadas, mesmo que tenha assinalado tal opção no Requerimento de Inscrição.
No entanto, os decretos mencionados e a súmula 377 do Superior Tribunal de Justiça estão revogados pelas Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência que propõem um conceito de deficiência em evolução, cujos impedimentos se relacionam diretamente com a falta de acessibilidade dos ambientes educacionais, sociais e de trabalho.
Diante da falta de um instrumento de avaliação biopsicossocial, tal como está previsto no artigo 2º da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), as boas práticas em algumas instituições que realizam seus concursos públicos, apoiam-se em suas próprias equipes multiprofissionais para viabilizar o acesso de candidatos e candidatas com deficiência, incluídas as pessoas com deficiência mental (relacionadas à saúde mental), uma das naturezas de deficiência previstas na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O que se espera é que o Banco do Brasil não se fixe em regulamentações revogadas, ou exclusivamente na visão médica e na Classificação Internacional de Doenças (CID). Ao assim proceder irá inviabilizar o acesso ao concurso público de pessoas com suas diversas naturezas de deficiência.
Ao contrário, o Banco do Brasil deve considerar o inciso IV do artigo 3º do Decreto nº 9.508/2018 quanto à exigência de apresentação pelo candidato com deficiência, no ato da inscrição, de comprovação da condição de deficiência nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, sem prejuízo da adoção de critérios adicionais previstos em edital;
A AMPID espera a revisão do EDITAL DE ABERTURA SELEÇÃO EXTERNA 2021/001 EDITAL Nº 01 – 2021/001 BB do Banco do Brasil, adaptando-se integralmente aos regramentos constitucionais e legais.
Brasilia, 6 de julho de 2021.
MARIA APARECIDA GUGEL, Presidenta
GABRIELE GADELHA BARBOZA DE ALMEIDA, Vice-Presidenta
Brasilia, 6 de julho de 2021.
MARIA APARECIDA GUGEL, Presidenta
GABRIELE GADELHA BARBOZA DE ALMEIDA, Vice-Presidenta
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